Aviso

Queridos irmaos o chat esta aberto a todos ...aqueles que sentirem necessidade pode la fazer sua prece individual...usem e fiquem a vontade pq a espritualidade presente ira acolher depende unicamente da fé de cada um.....
Muita paz e luz a todos

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

OLHOS DE VER E OLHOS DE OLHAR



       O DR. PIMENTEL CORTOU O CORDÃO umbilical, enrolou a criança em uma toalha — era uma menina —, colocou-a cuidadosa­mente de bruços e passou a cuidar da mãe, exausta e dolorida.
       Eu tinha 23 anos de idade e pela primeira vez na vida agitavam-se em mim as poderosas emoções da paternidade, com todas as suas perplexidades, complexidades e expectativas.
       Aproximei-me do pequeno embrulho sobre a cama para olhar de perto minha filha. Pensava, talvez, encontrá-la cochilando, a sonhar, ainda, com os mis­térios de suas origens. Foi uma surpresa observar que tinha os olhi­nhos escuros bem abertos, atentos e acesos, a me contemplarem de maneira enigmática e inquisitiva. Lembro-me perfeitamente das ru-guinhas traçadas na testa exígua, pelo esforço que fazia ao levantar a cabecinha careca, como se perguntasse a si mesma:
       — Será que esse sujeito vai ser um bom pai para mim? Cadê minha mãe? E agora, que vão fazer comigo? Quanto tempo vou ficar aqui, enrolada neste pano?
       Quanto a mim, não me recordo dos pensamentos que transi­tavam pela minha mente, mas sei que eram muitos, e desencontrados. Acho mesmo que tinha tantas perguntas quanto ela, talvez mais, não sei. Uma coisa era certa: Ana-Maria acabava de chegar. (Eu sabia o nome dela porque já o havíamos escolhido com a devida antecedên­cia. Embora houvesse um nome masculino de reserva, de certa forma eu ‘sabia” que seria uma menina. Mistérios esses que hoje entendo melhor do que então.) Que ela chegara, não havia dúvida, pois estava ali, olhos curiosos, prontinha para começar a exploração do novo mundo em que viera viver. Minha dúvida era outra, ou seja, de onde vinha aquele ser? A lógica me dizia que se chegara aqui é porque partira de algum lugar, onde estava antes de vir. Onde, porém? Aprendera eu, em tempos, agora remotos, da infância, que Deus criava uma alma novinha em folha para cada criança que nascia, mas eu tinha já minhas dificuldades com essas e outras informações. Não havia como questionar a sabedoria, a grandeza e o poder de Deus, que ali estavam patenteados, mesmo porque, obviamente, não pode­ríamos, ajovem esposa e eu, ter criado aquela pessoinha a partir do nada. Eu aprenderia mais tarde que o ser humano descobre coisas, mas não as cria, nem as inventa, e nós, certamente, não havíamos inventado aquele embrulhinho morno de gente que atentamente me espiava.
Quem seria aquele ser? De onde vinha? O que pretenderia da vida? Como seria ela? Que papel me caberia, e à sua mãe, na vida que apenas começava? Ou será que não estava começando e sim continuando?
Eu não sabia. Mas queria muito saber, ter respostas para essas indagações e muitas outras, de que nem me lembro ou sequer tenham sido formuladas, mesmo porque, como disse, eu mergulhara em um turbilhão de inesperadas e insuspeitadas emoções. Estas, contudo, não me suscitavam temores ou inquietações e sim uma estranha ale­gria, ao perceber que também eu tinha condições de participar, com minha modesta contribuição, daquele deslumbrante espetáculo de renovação da vida.
As dúvidas ficavam para mais tarde. Um dia eu saberia, devo ter pensado. Por enquanto, havia providências a tomar, neste lado de cá da vida, onde os seres chegaram há mais tempo e andam, falam, riem e choram. Mas bem que eu gostaria de ter alguém ali que me dissesse alguma coisa sobre o que estava acontecendo diante de mim.
Este é, pois, o livro que eu gostaria de ter tido em minhas mãos, não só naquele distante 22 de agosto, mas antes, quando Ana-Maria era apenas projeto, bem antes que seu marcador pessoal começasse a registrar o tempo vivido na Terra.
Algumas das minhas perguntas ainda teriam de esperar um bom punhado de anos. Outras, creio eu, precisarão de mais alguns séculos, pois nosso Pai Maior não parece ter grande pressa em explicar-nos aquilo que nós ainda não temos condições de entender.
O apóstolo Paulo, que sabia das coisas, escrevendo aos seus amigos de Corinto, disse o seguinte:
— E eu, irmãos, não vos pude falar como a (seres) espirituais se­não como a carnais, crianças em Cristo. Dei-lhesleite a beber e não alimento sólido porque ainda não o podíeis suportar. Nem ainda agora o podeis, porque ainda sois carnais.
Como os coríntios, eu era carnal e acho que nem o leite me fora dado, porque tudo quanto eu podia ver é que, de alguma forma, havia um pouco de mim naquele tépido bolinho de gente, à espera de que a tomássemos nos braços e, depois, pelas mãos, lhe mostrássemos como era nosso mundo. E já sentia, nas profundezas da memória do futuro, aquele dia em que ela não mais precisasse das nossas mãos e partisse para viver a sua vida. Nós sempre tememos um pouquinho.
Não é que falte confiança, é que paira sempre, aí por cima, um vago temor de que o filhote ainda implume não consiga acertar com os invisíveis caminhos do céu, que tem de percorrer no vôo ainda incerto. Mas isso não chegava a ser uma tristeza, porque, afinal de contas, a vida era dela e não nossa, e como eu aprenderia posterior-mente, antes de sermos filhos uns dos outros, somos todos filhos de um só Pai. E Ele tem sido muito competente, pois sempre deu boa conta de nós.
Não era tristeza; nada disso! Apenas uma saudade antecipada, que me espreitava das dobras do desconhecido, tal como os olhinhos escuros de Ana-Maria. Parece que eu via, também, no futuro, umas ruguinhas de preocupação. Ou seria apenas a exaltada imaginação de um jovem pai de 23 anos, mal saído de sua própria infância?
Seja como for, de alguma forma misteriosa e inarticulada, pois não tinha palavras para expressar tudo aquilo, eu confiava em Deus e na menina dos atentos olhinhos. Como também confiaria em duas outras pessoas que, sem eu saber, estavam à nossa espera, do outro lado do véu, que àquela altura me ocultava importantes mistérios da vida. Deus não julgara oportuno revelar-me coisas para as quais eu ainda não tinha “olhos de ver”. Meus olhos eram apenas de olhar...

Nem Deus, nem meus filhos me decepcionaram, porque muito me ensinaram desde então; mas às vezes penso que as coisas teriam sido mais fáceis se eu tivesse lido algo parecido com este livrinho que o leitor tem agora em suas mãos. Só que, se assim fosse, eu não teria tido a alegria de escrevê-lo e não estaria hoje tão grato a Deus por ter-me permitido fazê-lo. E a Ana-Maria, Marta e Gilberto por terem me ensinado muitas das coisas que nele foram colocadas e que, sem eles, teriam passado despercebidas ao desatento olhar do apressado viajor.
fonte livro:NOSSOS FILHOS SÃO ESPÍRITOS
HERMÍNIO C. MIRANDA